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terça-feira, 20 de novembro de 2007

Desenvolvimento

Este post conta um pouco (demais) da minha história. O início está aqui, se quiser passar a algo um pouco menos maçante, clique aqui.

Como ia dizendo, gastei algumas dúzias de horas da minha vida caminhando quilômetros em um salão de 30 metros quadrados. Nesta época, ainda na escola secundária, alimentamos por algum tempo a idéia besta de ter um bar na casa de alguém, de forma a poder reunir-nos sem gastar uma fortuna, escolher boa música e beber coisas boas.

Não sei bem quando, as mesmas maquininhas que construíram o Ad Poculum Vini deram para elaborar um bar móvel, que tivesse como servir minimamente bem, sem as obrigações de todo tipo criadas pelas raízes (inclusive freqüência). Foi no Santonim, após um dos turnos de trabalho na padaria, que expus pela primeira vez essa idéia.

Me tornei aos poucos o responsável pela carta do restaurante, passando a experimentar vinhos semanalmente e selecioná-los. Comecei a comprar revistas e logo livros, em busca de justificar minhas escolhas com um mínimo de referências e foi justamente aí, em especial através de uma cliente que era também fornecedora, que o vinho passou a me perseguir. Comecei a organizar o serviço das degustações (os míticos Flights de Vinho da Dulce) e a experimentar cada vez mais vinhos de variados tipos e níveis de qualidade.

Por volta de um ano depois daquela noite no Santonim, uma das minhas companheiras de trabalho, que é atriz mas sempre esteve enfiada na cozinha, me perguntou se eu não tinha uma idéia pra um negócio em que ela pudesse investir o dinheiro que tinha guardado. Essa conversa somou-se à do restaurante e durante cerca de 2 anos fomos três escravos do trabalho, praticamente planejando e implementando um novo restaurante a cada mês. Foram, no total, 10 diferentes restaurantes criados em vários ambientes pela cidade, muitas vezes "reformados" com nossas próprias mãos (e as de alguns queridos amigos).

O Itinerante

Mais ou menos por aí, inaugurou-se a primeira turma do curso de Gastronomia em Belo Horizonte. Juntei minhas fichinhas morais e informei a meu pai que era isso aí mesmo que eu iria estudar e fui lá fazer a inscrição. O curso provocaria um verdadeiro malabarismo de horários, divididos entre o trabalho na padaria, meus estudos pessoais de Logosofia, um namoro intenso e o projeto meio louco do Itinerante.

Incipit - da escola ao trabalho

A meu pedido, já há alguns meses, uma querida jornalista de eno-gastronomia foi gentil em dar uma lida no blog e enviar-me suas opiniões. Ela foi enfática em ressaltar: "Acho que você poderia se identificar um pouco mais. Acho que ajuda a criar a confiança no leitor sobre quem é este cara que está escrevendo sobre vinhos."

Demorou, mas decidi escrever (talvez um pouco demais) contando como foi que vim parar aqui. Pra quem quer ganhar confiança, ou não tem medo de perder a que talvez já tenha, coragem, lá vamos nós:


Tive a boa estrela de estudar meu segundo grau numa escola um tanto diferente, mas que, como toda escola, oferecia aos estudantes oportunidades pelo menos anuais de apresentar seus trabalhos e demais criatividades para os pais e colegas.

Nessa época, como bom adolescente, eu gastava boa parte do meu tempo útil imaginando coisas para fazer da vida ao invés de prestar atenção às aulas de Latim - e acredite, em 4 anos há muito tempo para imaginar, enquanto o professor recita as Catilinárias.

Marcus Porcius Cato (acima), autor das Catilinárias:
Dum praedicaba
Nazareno, cogitatione Beda iter faceba.

Um dos muitos esboços que fiz, junto a tabuleiros de lig-4, batalha naval e jogos de palavras absurdos, foi uma espécie de taverna, inspirada por algum lema latino do porte de "In Vino Veritas", com balcão e bebidas e ares de antro de rufiões e soldados que, após alguns dias de maquinações mentais e a colaboração de outras mentes férteis, veio a tornar-se o Ad Poculum Vini (Ao Copo de Vinho), provavelmente o primeiro restaurante estudantil da escola, durante a famigerada feira de cultura.

Com um pouco de pesquisa e excesso de imaginação, criamos um barzinho escuro e super-aquecido pelo teto baixo de tecido utilizado para compor uma ambientação. Movido a tortas, pães, chás exóticos, música de época, figurinos estrambólicos e qualquer coisa que tenhamos podido empurrar como "medieval", o restaurante desencadeou um processo do qual muitos saíram ilesos, mas eu não.

Mais ou menos na mesma época, comecei a trabalhar como garçon em uma padaria/bistrot que é referência há muito em Belo Horizonte, onde passei a tomar contato com as bases da cozinha internacional: ingredientes, métodos de cocção, receitas tradicionais. A influência que tiveram esse lugar e as pessoas que eu conheci aí nas minhas escolhas futuras poderia ser descrita como criminosa por meu pai, que alimentava não muito secretamente uma esperança de que eu viesse a me formar em Direito ou algo que o valesse.

A primeira Casa

Era recorrente que as noitadas entre os amigos se transformassem em pequenas orgias alimentares e eu passei a integrar o time dos que iam para o fogão, sem maiores motivos além do de que tínhamos talvez mais paciência e um risco menor de arruinar a comida que os outros. Enquanto isso, na Sala da Justiça (Gastronômica), eu aproveitava qualquer oportunidade de trabalho pra sacar um dinheirinho enquanto aprendia aqui e ali a fazer alguma coisa da vida, participando de feiras de gastronomia e eventos com a padaria.

A coisa tomou rumo mais definido quando a gerente da casa decidiu montar seu próprio restaurante - o infelizmente falecido Santonim - e me deixar temporariamente no lugar dela. As conseqüências foram desastrosas: o temporariamente se alongaria por cerca de dois anos, durante os quais eu passei a freqüentar degustações de vinho, conhecer fornecedores, participar ativamente do dia-a-dia do restaurante e organizar uma equipe que unia o que se havia peneirado do grupo que eu integrava com gente selecionada e treinada pelo meu próprio punho, me levando a duas idéias que me condeneriam até hoje.

Continua aqui.

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Be Fresh

Descobri ontem acompanhado da Gaya um refúgio no Itaim: recém-inaugurado, o Be Fresh é um restaurante de comida alternativa e, mais precisamente, "saudável". Normalmente, eu fujo um pouco de vegetarianismos e outros movimentos meio hippie-gastronômicos, mas o lugar me fisgou rápido, só de olhar.

O espaço é muito agradável: amplo, claro e com uma brisinha leve constante. A sensação é de estar no Rio de Janeiro e não no meio do concreto paulistano.
O serviço, apesar de talvez ainda um pouco verde, sem prática, é um dos melhores que eu já encontrei em São Paulo (paradoxal, não?). Os garçons são jovens, atenciosos e conscientes dos produtos que estão servindo.

Importante: come-se de tudo. Há muitas saladas, é claro, mas também sanduíches (em pães muito bons, que parecem produzidos na própria casa), pratos quentes e entradas. Querendo, come-se até hamburguer ou carnes grelhadas. Vale provar o sanduíche italiano no pão com linhaça e o prato de camarões num misto de arroz selvagem e integral com cravo, mas sem enjoar.

Os sucos, processados em centrífuga, são densos e saborosos, doces sem nada de açúcar adicionado: a centrífuga processa bem as frutas, separando a parte fibrosa e colocando todo o resto no copo. Há combinações interessantes, mas os simples tangerina e melancia refrescantes e gostosos.

Um problema: as cadeiras são muito confortáveis, mas do tipo que não permitem apoiar as costas enquanto se come... há também sofás bem agradáveis e conexão wi-fi gratuita. Bom pra tomar algo e trabalhar ao mesmo tempo.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

O Degustador Perfeito

"O filósofo, David Hume, perguntou se haveria um padrão para o gosto. A solução de Hume foi confiar na excelência de juízes ou críticos que
  • mostrassem delicadeza de julgamento;
  • fossem livres de preconceitos;
  • pudessem basear-se numa ampla gama de experiências para comparações;
  • prestassem a devida atenção e
  • não se deixassem ofuscar pelo humor"
A discussão vai mais longe que isso, mas meus padrões pessoais como degustador sem dúvida terão um arquétipo, de agora em diante.

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Vinho e Movimento

Leia a introdução deste artigo em "Matt Kramer e o Armazenamento de Vinhos"

O segundo aspecto analisado por Matt Kramer em seu livro "Making Sense of Wine" - que, vocês já sabem, foi lançado no Brasil há pouco - é o movimento. Todo mundo já leu, ouviu, viu, que a adega ou o lugar onde o vinho vai ficar guardado tem de ser também "tranqüilo". As vibrações, segundo os especialistas, são maléficas para o vinho e aceleram seu envelhecimento.

Kramer começa contando a história de um comerciante de vinhos de Bordeaux, Edouard Kressmann. O pai de Kressmann pensou ter descoberto um paralelo entre a amplitude da onda da vibração e o quanto a mesma é capaz de acelerar o envelhecimento do vinho e "inventou" um método que ele chamou de "envelhecimento por concussão". O tal método consistia em fazer seu filho Edouard espancar repetidamente uma espécie de cone de bronze preenchido com vinho, com o único resultado, é claro, de exaurir o rapaz e talvez gerar-lhe umas dores musculares.

Outra história contada no livro fala do moleiro que, não tendo vinho no ponto de amadurecimento para o casamento da filha, teve a seguinte (e fabulosa) idéia: amarrar seus barris nas pás do moinho para que este, girando, acelerasse o desenvolvimento da bebida. Sem dúvida o que ele conseguiria de mais relevante seria cozinhar seu vinho no calor...

De acordo com os experimentos do Dr. Singleton, da universidade de Davis, na Califórnia, as vibrações comuns em nosso dia-a-dia são insuficientes para gerar qualquer tipo de defeito em um vinho. Para que a vibração torne-se algo danoso, é necessário que esta seja intensa e constante, de modo a afinar continuamente uma eventual borra, tornando-a tão fina que seja incapaz de assentar-se, o que mantém o vinho constantemente turvo e influencia seus sabores.

Portanto, a vibração gerada por carros na rua, passos no assoalho e aparelhos de ar-condicionado, fica descartada como fator de agressão ao vinho.
Por outro lado, diz o doutor, movimentar as garrafas pode ser altamente arriscado: transportar o vinho de um lugar a outro quer dizer, quase sempre, expô-lo a condições altamente prejudiciais à sua qualidade.

Apesar de movimentos bruscos também serem potenciais "contaminadores" do vinho fazendo levantar as borras o que, especialmente em vinhos mais velhos e delicados, pode ser um problema difícil de resolver, as condições a que se refere o Dr. Singleton são outras: normalmente, quando em viagem, as garrafas são expostas a temperaturas elevadas, essas sim efetivamente inimigas da vida do vinho.

O próximo trecho trata justamente de como o vinho se comporta sob influência de diferentes temperaturas.

Vinho sem (muito) mistério - e em Português

Desde que encontrei numa pilha no escritório em que trabalhava em Belo Horizonte uma velha cópia re-encadernada do livro "Making Sense of Wine", de Matt Kramer, ele tornou-se basicamente o meu livro-referência de vinho.

Citei-o algumas vezes nos meus textos e está em andamento uma seqüência totalmente baseada nos artigos de Kramer sobre o armazenamento do vinho. A desenvoltura com que ele fala dos assuntos mais cabeludos, mais debatidos e mais controversos me prendeu ao livro e me fez sentir livre de algumas amarras que o primeiro impacto do mundo do vinho freqüentemente impõem.

Fiquei bastante feliz quando adquiri uma cópia re-editada e atualizada há pouco tempo via Amazon.com - a minha mais forte aliada na luta contra a sobrecarga de preços dos livros importados nas livrarias nacionais - mas me deixou ainda mais feliz ver que o mercado editorial brasileiro está investindo em livros de alta qualidade técnica para um dos públicos (embora restrito) mais exigentes do mundo no quesito conhecimento enológico: dois dos mais importantes autores de vinho acabam de entrar para o rol dos que poderão ser encontrados nas nossas prateleiras e o que é melhor - e indispensável para muitos - em bom português:

O primeiro deles, é claro, é Kramer. Com o nome de "Os Sentidos do Vinho", a editora Conrad traz para nós um "manual de libertação das amarras", um verdadeiro derrubador de mitos. O livro está sendo vendido nas livrarias por acessíveis R$43,00 - embora eu deva fazer notar que o original em inglês, comprado novo pelo site americano, com o frete e o atual câmbio, saia por menos de R$40,00.

O segundo livro, na verdade, tem seu lançamento previsto para Setembro de 2008 no Brasil, mas já deve ser comemorado como conquista brazuca: a editora Nova Fronteira comprou os direitos de publicação do indispensável Atlas Mundial do Vinho, de Hugh Johnson e Jancis Robinson. Completamente revisto e ampliado, dando mais destaque às regiões produtoras em ascenção (entenda-se em particular Argentina, Chile, e China, entre outras), o Atlas chega à sexta edição trazendo a feliz notícia para os eno-cartófilos nacionais.

Restam, porém, um e outro livro fundamental que eu gostaria muito de ver na prateleira. Seguem as minhas sugestões:

  • A História do Vinho, de Hugh Johnson - foi publicado pela Companhia das Letras, esgotou e não houve re-edição recente... Porque será?

  • Adventures on the Wine Route, de Kermit Lynch - considerado leitura obrigatória no meio, é uma espécie de "On the Road" enológico que conta as viagens do primeiro importador de vinhos moderno norte-americano pela França.

  • Questions of Taste - Philosophy of Wine, de vários autores - recém-lançado lá fora. Estou aguardando minha cópia, então ainda não posso dizer muito. Porém, o livro trata justamente de algumas das questões mais polêmicas (gosto, notas, preços) e alguns dos aspectos mais intimidantes do vinho (a descrição das características, os aromas, a percepção da bebida).

  • O Gosto do Vinho, de Émile Peynaud - O professor Peynaud talvez seja o maior contribuinte contemporâneo para o desenvolvimento das técnicas de produção de vinho. Seu livro de prova, muito técnico, existiu em português em edição lusa, hoje também esgotada.

  • Teoria e Prática da Degustação dos Vinhos, de Giancarlo Bossi - renomado degustador e autor italiano, chegou a ter seu livro traduzido e publicado no Brasil na década passada. Nadica de nada nas lojas hoje.


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Peripécias Palacescas de um Quase by Bernardo Silveira is licensed under a Creative Commons 2.5 Brasil License.
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